Entrevista: Primeiros passos

Uma das atividades mais básicas do jornalista é unir informações soltas e transformá-las em material que seja claro, rico e que, ao mesmo tempo, possa ser compreendido por qualquer pessoa independente do grau de instrução. Porém, na prática, nem tudo é tão fácil como na teoria. Cada área do jornalismo possui desafios que devem ser, diariamente, superados.

Na entrevista, a jornalista carioca Eliane Cantanhêde fala sobre os desafios que cercam a cobertura jornalística de assuntos políticos – principalmente para quem está começando a carreira. A primeira vez que ela teve contato com a prática jornalística foi em 1972 quando ainda cursava o 2º ano de Jornalismo na Universidade de Brasília (UnB). Esse ano marcou o início de suas aventuras como estagiária. Depois de 38 anos de profissão, somou experiências como repórter da revista Veja, colunista do Jornal do Brasil e do Estado de S. Paulo, além de ser diretora de redação das sucursais de O Globo, Gazeta Mercantil e da Folha de S. Paulo em Brasília. Desde 1997 a jornalista é colunista fixa da Folha nas versões impressa e online, onde escreve sobre política interna e externa, área social e comportamento.

A conversa sobre jornalismo em uma quente tarde de segunda-feira. Simpaticíssima e descontraída, apesar da impessoalidade do telefone, Eliane disse gostar de falar a estudantes, já que foi na faculdade onde “se encontrou” profissionalmente. Ela estava na redação da Folha quando respondeu às perguntas da repórter.

1 - Quais são os maiores desafios para fazer Jornalismo Político?

É ter fontes próximas o suficiente para te dar uma boa informação, mas longe o suficiente para você não ser contaminada e não tomar partido. É preciso equilíbrio. Estar pertinho para saber das coisas, mas sem se envolver.

2 – Você estipulou limites em relação ao envolvimento com suas fontes políticas?

Eu conheço fontes de todos os partidos, de todas as tendências, de todas as gerações. Mas eu não tenho vínculos com lado nenhum, com fonte nenhuma, partido nenhum. É claro que somos pessoas humanas. Têm pessoas com quem eu gosto mais de conversar e tem pessoas que eu gosto menos. Mas não deixo que isso interfira na minha capacidade de analisar e informar. E a gente aprende isso com a experiência.

3 – Como não ser enganado pelo discurso político?

Esse é o grande pulo-do-gato. Quando você fica um repórter um pouco mais experiente, você colhe a declaração e contextualiza. Quando você fica mais experiente ainda - como acontece comigo, que trabalho com opinião - mais do que a frase, me interessa o porquê que aquela frase foi dita e como eu enxergo o que foi dito. Porque eu tenho que conhecer o personagem, os interesses daquele personagem, as alianças dele pra saber não o que ele disse, mas porquê ele disse.

4 – Que características um jornalista que cobre política precisa ter. Habilidades, afinidades?

Primeiro: a cobertura política não é cartesiana. Em política, dois mais dois nem sempre são quatro. Então você precisa ler muito, ter uma boa capacidade de interpretação de texto e de fala, você precisa conhecer os personagens [os políticos] acompanhar o noticiário, não só o nacional, mas o dos estados também. E precisa ser muito, muito curioso. Tem que querer entender o que tá por trás das coisas e tentar projetar o que vai acontecer [depois] daquela reunião, daquela frase, daquele discurso. E as conseqüências dessas coisas todas.

5 – Para um estudante de jornalismo que deseja investir nessa especialidade, por onde começar? Com quem falar, que livros ler, que hábitos ter?

Coisa mais importante do mundo: gostar de ler jornal, revista, ouvir rádio e assistir aos principais telejornais do País – além de programas de TV, também. Tem uns [programas de TV] muito bons como o Roda Viva, por exemplo. Dessas coisas você tem que gostar mais do que da internet. Consultar a internet é bom, mas deturpa muito. Cada um escreve o que bem entende lá. No jornal [impresso], quem escreve é fiscalizado, você é cobrado pelo que escreve. Então eu sugiro que o jovem estudante leia jornal, leia revistas.

Além disso, tem outras coisas básicas como conhecer a história e a geografia brasileira, da América do Sul, da América Latina, do mundo. Quando fiz meu curso [de Jornalismo], por iniciativa própria estudei um pouco de Introdução ao Direito, Introdução às Relações Internacionais, Introdução à Economia e sempre estudei línguas. Você tem que ter uma visão geral, precisa saber ler um artigo da Constituição, precisa ter uma noção da área de Economia. E precisa entender que o Brasil não tá perdido no mundo, ele está inserido num todo.

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