Objeto de decoração

Se existe uma ferramenta publicitária que dificilmente cairá de moda é o emprego da imagem da mulher como mecanismo de propaganda, uma utilização do corpo e da figura feminina como objeto. Etimologicamente, transformar ou tratar como coisa algo que não é, significa “reificação”, prática existente desde que o mundo é mundo.

O fato é que, na mídia, o termo pode ser facilmente empregado quando o assunto é estimular o consumo através das curvas de uma bela jovem. Para Karl Marx, o famoso economista e sociólogo que deu origem ao marxismo, reificação é o ato de “apresentar o ser humano como objeto físico privado de qualidades pessoais ou de individualidade”. Ora, a presença de moças em propaganda de cerveja, por exemplo, facilmente se encaixa nessa definição. A atribuição da conquista ou, porque não, da compra à feminilidade; transforma apenas em aparência e sensualidade todo o aspecto abstrato e complexo que é pertencer ao sexo feminino.

Embora, no marxismo, a definição de “reificar” faça alusão ao modo de produção capitalista, é possível utilizar esse significado também nas relações sociais tanto de ordem sentimental, como mercadológica. Com a tão falada luta pela igualdade entre os sexos e com o estabelecimento da mulher no cenário global como pessoa de negócios e, ao mesmo tempo, como chefe do lar; parece que se tornou ultrapassado o desejo de ter um parceiro que a ofereça segurança e amor. É como se, assim como um carro de luxo, as mulheres devessem ser adquiridas - e não conquistadas - de acordo com suas características pessoais: quanto mais agrada as vontades do comprador e quanto menos usado está o veículo, mais valioso é o produto.

Porém, apesar dessa sociedade pós-moderna e individualista, as mulheres não são como carros de luxo. Ao contrário, elas ainda querem ver realizado um velho sonho: ter estabilidade emocional – desejo cada vez mais difícil de ser concretizado uma vez que falta às mulheres autovalorização e respeito, e aos homens menos apego às características exteriores da beleza feminina. Uma mistura que, quando ocorre, resulta em casamentos desfeitos como trocas de mercadorias em lojas e a destruição de famílias apegadas à fantasia de ter uma vida como às de cinema.

Parece que as pessoas não sabem (ou esquecem) que o mundo perfeito criado pela mídia, recheado de rostos impecáveis, corpos esculturais e sem imperfeições, nada mais é que resultado de recursos tecnológicos. Recursos esses, não de saúde, mas de computador. Programas de informática, como o photoshop, que criam uma atmosfera de encanto, mas que, na maioria das vezes, não passa de fruto da imaginação humana, infelizmente.

Foi para tentar “acabar com a idealização do corpo humano pela publicidade e com a difusão da ideia de que as modelos e os modelos retratados são perfeitos”, o deputado Wladimir Costa (PMDB-PA) criou o Projeto de Lei 6853/10. Em tramitação na Câmara dos Deputados, iniciativa pretende tornar obrigatória a presença de um aviso informando que recursos de edição foram utilizados na foto caso a imagem tenha passado por manipulação. No descumprimento da “Lei do Photoshop”, como o projeto ficou conhecido no Brasil, a multa pode variar entre R$ 1,5 mil e R$ 50 mil.

Em alguns países europeus, como França e Reino Unido, a discussão também já foi levantada. Lá, o projeto que, como no Brasil, ainda não foi aprovado, prevê um anúncio no rodapé da imagem evidenciando que foto passou por tratamento, como no exemplo: “Esta imagem foi modificada digitalmente e pode não corresponder à realidade”.

O fato é que, submetida a pequenos retoques, ou não, a mídia sempre acaba interferindo na vida real causando consequências mais do que reais. A capixaba Sheyla Almeida Hershey, de 30 anos, sonhava em ganhar fama e conhecimento. Alcançou seu objetivo após se submeter a cirurgias para aumentar o busto. Com o feito, foi considerada a mulher com as maiores próteses de silicone do mundo por causa dos cinco litros e meio de silicone que chegou a ter em cada mama. Porém, recentemente, por causa de uma nova cirurgia, a modelo sofreu uma grave infecção bacteriana nos seios e passou a correr risco de morte.

Qual o preço do sucesso? Quanto as pessoas estão dispostas a pagar para estarem na mídia? Ou, melhor, qual o preço que nós, enquanto sociedade, estamos pagando por causa das “leis midiáticas” sobre o que é belo, sexy ou cool? Não pode ser normal meninas ricas morrerem de inanição porque acham que estão acima do peso. Não é possível ser natural garotas tirarem a roupa e exporem seu corpo em nome de um produto “louro e gelado” que embebeda e aniquila lares inteiros. Mas essa é nossa realidade, infelizmente.

Um comentário:

  1. Texto que expressa a consciência da jornalista, espero que este grau de visão seja expandido em nossa sociedade que necessita de valores reais. Sem hipocrisia, mas pelo exame e discernimento dos cidadãos!!E que a busca da felicidade esteja também na beleza interior, essência que continua luminosa!

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